11 de abril de 2010

Matarte no Salão #5: O “descobrimento” do Miniconto

Muita gente já cansou desse papo de Salão do Livro, mas dentro do que eu pude presenciar, seria injusto encerrar a série Matarte no Salão sem publicar algo para compartilhar com vocês sobre aquela que foi a grande novidade desta edição pra mim: o formato literário de minicontos.

No mesmo dia e horário em que muita gente se candidatou a uma vaga no auditório central para ver a palestra de Ariano Suassuna, eu me programei antecipadamente para assistir no espaço jovem a palestra do gaúcho Marcelo Spalding sobre Literatura Digital, que principalmente pelo tesão que tenho de escrever para este blog, passou a ser um tema de grande interesse da minha parte. Afinal não quero escrever sobre as notícias do último minuto aqui. Quero apenas aprender cada vez mais a escrever textos que possam ser lidos hoje ou daqui a uma semana, um mês, um ano, que ainda serão interessantes.

Com 20 anos de idade, eu era um dos mais velhos dentro do local. Isso me surpreendeu, mas acostumado a escrever para o público juvenil, Marcelo Spalding prontamente direcionou o discurso da palestra para a geração que lê no máximo, Crepúsculo. Apesar de ter de filtrar boa parte do conteúdo da palestra, ele ainda conseguiu prender a atenção interagindo diretamente com a plateia. Até que da metade pro final, não teve jeito, nem que soltassem uns 30 Nardoni teria como impedir a molecada que GRITAVA e corria para todos os lados.

Com muito esforço, fiquei até o fim da palestra, e fui conversar com o escritor na tentativa de absorver um pouco mais do conteúdo que ele mesmo admitiu que não pôde passar nem metade do que estava previsto. Em uma breve conversa, ele me deu o seu livro de minicontos. Basicamente, este foi um momento fundamental daqueles em que as luzes são direcionadas para quem está recebendo um prêmio em cima do palco diante de muitas pessoas, ou até mesmo quando brilham os olhos de alguém que assiste televisão pela primeira vez após vários anos de vida. Assim me senti ao ser apresentado ao formato.

A experiência de ler minicontos é vital para quem quer manter o hábito da leitura, mas não consegue se concentrar em longos textos por conta da vida corrida entre trabalho, estudos, namoro e excesso de informações pela internet. Esse estilo de contar alguma história ainda é pouco discutido, todavia ele tem algumas pré-definições que podem ajudar a identificá-lo: são textos curtos que embora não seja regra, geralmente variam de uma frase até no máximo 100 palavras; possui narrativa com começo, meio e fim assim como um conto qualquer, no entanto costumam ser textos riquíssimos nas entrelinhas, que o levam a ser chamados também de poema em prosa ao conduzir e provocar reflexões no leitor pela subjetividade, fazendo com que o texto deixe de ser “mini” na cabeça do leitor.

Ainda que possua uma estética moderna e ideal para os dias atuais, os minicontos não são tão recentes quanto se pensa, e já consagrou o escritor hondurenho Augusto Monterroso nos anos 60 como o principal escritor do estilo, e tem Ernest Hemingway como o autor de um dos minicontos mais famosos: “Vende-se: sapatos de bebê, sem uso”. No Brasil, Dalton Trevisan é considerado o pioneiro do estilo com o livro “Ah, é?”, publicado em 1994. Em 2004 foi lançado o livro “Os cem menores contos do século”, contendo textos breves escritos por 100 autores como Moacir Sclyar, Millôr Fernandes e o mesmo Dalton Trevisan, convidados especialmente para a publicação.

Se tivesse de indicar a leitura de minicontos para públicos específicos, recomendaria para quem gosta de poesia, ou de histórias bem contadas, ou de ler no ônibus, ou de ler pouco, ou de ler tirinhas, ou de twitter, ou até mesmo de mensagens publicitárias. Esqueci de alguém?

Para começar (e encerrar este texto), recomendo Marcelo Spalding, que recomenda Leonardo Brasiliense e Ana Mello.

“Helena é virgem desde que o pai sumiu de casa.”

Marcelo Spalding

“O atendente da farmácia viu que eu entrei meio sem graça. Sorriu, malicioso. Eram dez da noite, e eu não tinha cara de doente. Ele até olhou para a porta, como procurando mais alguém. Quando cheguei perto da gôndola das camisinhas, o bobalhão desviou o olhar de mim, disfarçando muito mal. Fingiu que arrumava uns folders em cima do balcão, mas sempre com o sorrisinho idiota, que só parou, só se fechou quando pus na frente o pacote de fraldas.”

Leonardo Brasiliense

Suicidou-se. Não quis esperar um fim que já era certo desde que nasceu.”

Ana Mello

Marcelo Spalding é um jovem escritor de apenas 27 anos, mas que recebeu seu primeiro prêmio com 11 anos de idade através do concurso Jornalista Por Um Dia, do jornal Zero Hora. Jornalista diplomado em 2005, é autor de 5 livros nas categorias juvenil e adulto. Atualmente é vice-presidente da Associação Gaúcha de Escritores.

Trechos do conteúdo deste texto foi garimpado da dissertação de mestrado de Spalding disponível aqui.

5 comentários:

PatiStröher disse...

Hey meninos,
Pra começar, adorei o texto. Um dos autores de miniconto que conheço e na minha insignificância recomendo, é o gaucho Fabricio carpinejar (@CARPINEJAR).

O/
Vou trabalhar.

Petit disse...

nao conseguih ler pq tava rindo da parte dos nardoni. hahaha

Ciro Gonçalves disse...

Nardoni, tenho medo. #miniconto

Anônimo disse...

Só pelo fato da postagem ter sido sobre literatura vocês se fazem dignos de um comentário meu (e de meu anjo #xuxafeelings). =)

Lá vai então uma pérola de miniconto, a meu ver, um dos melhores:

Historieta nº 153

Ele sai do banheiro, a toalha na cintura.
- Pai, deixa ver o teu rabo.
É a tipinha deslumbrada no baile da debutante de três anos.
- Rabo, filha? Ah, sei. O bumbum do papai?
- Seu bobo.
- ...
- Esse pendurado aí na frente.

(Historieta nº 153, de Dalton Trevisan.)

Lidiane Moreira disse...

Sabe o que dá vontade toda vez que entro no blog?? É tão gostoso de ler que dá vontade de comer...

Lendo o post me lembrei de coisas que sempre lia quando comecei a me apaixonar por literatura nacional aos 12 anos por aí...Tudo bem que hoje em dia eu me afastei muito da língua de Oswald de Andrade por conta da de Shakespeare.

São textos bem produzidos, sintaticamente e semanticamente. Linguagem verbal e imagética bem articuladas.

Antes eu lia Liberato Póvoa e os HQs de Maurício de Sousa debaixo de um pé de manga lá na minha infância feliz comendo rapadura em Dianópolis, eu acho que isso me fez muito bem! rs. Quando eu li Ernest Hemingway, Hemingway? Eu chorei! SÉRIÃO

Gente! Hoje as coisas mudaram. As “criançinhas” são alfabetizadas em inglês, então ngm pode tirar onda do anjinho #xuxafeelings . rs